por Antônio Vandir*
Era uma vez um bom servidor público.
Era um servidor laborioso, estudioso, dedicado,
cheio de senso de justiça e de espírito público.
De tão dedicado e probo
era admirado e respeitado.
De tão probo e dedicado
era odiado e rejeitado.
Mas seguia a sua vida de servidor público,
pois essa era a sua missão,
já que fora aprovado em certame, como reza a Constituição.
Claro que além dos eventuais inimigos, o bom servidor tinha
grandes amigos, a ele assemelhados, todos probos, todos dedicados.
Um dia fatídico, quando seus inimigos giravam a roda da fortuna,
digo, a roda dos infortúnios,
o bom servidor foi empurrado para o fundo de um fosso imundo.
Seus grandes amigos, probos e dedicados, ficaram um pouco revoltados
e diziam do absurdo que era aquele estado;
repetiam isso sempre que podiam, é claro que bem baixinho,
agachando-se discretamente à beira do fosso;
depois, seguiam em frente.
O bom servidor ficava muito comovido com a manifestação,
mas continuava no fosso, curtindo uma fossa, com os excrementos
causando-lhe náuseas.
Um belo dia, como são belos os dias finais das fábulas,
um desafeto passa pelo fosso e o reconhece,
repete as mesmas coisas que os amigos diziam, aqueles probos e retos e dedicados amigos,
porém, o desafeto além das palavras joga-lhe uma corda e diz:
sobe, bom servidor, o que ainda fazes aí no fundo desse fosso?
O bom servidor responde: estou a ouvir os bons conselhos dos meus grandes amigos,
todos probos, todos dedicados, todos retos e retilíneos, empertigados...
Então o bom servidor aceita a corda e sobe, tentando respirar o ar da sua decência.
Ao chegar ao rés-do-chão, o mesmo chão de todos os outros mortais,
ouve a reprovação dos grandes amigos,
envergonhados por ele ter aceito a corda,
já não o acham tão bom servidor assim;
melhor tivesse se enforcado com essa corda,
melhor tivessem os excrementos sufocado o ar de sua decência...
Mas o bom servidor continuou andando,
tentando adivinhar o chão que ele havia conquistado no certame constitucional,
querendo crer que ainda era um chão azul,
um chão reto, probo;
como eram retos, probos e dedicados os seus grandes amigos!
* Antônio Vandir é policial legislativo do Senado Federal e membro efetivo do Conselho Fiscal do Sindilegis.
Fonte: Imprensa Sindilegis - extraído do sítio http://www.sismamt.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=2048&Itemid=99
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